Autora: Dra. Amarilys de
Toledo Cesar
O que é medicamento homeopático?
Antes de mais nada, para compreendermos o que é medicamento homeopático
e como são preparados, precisamos voltar na história, ao tempo de
Hahnemann. Ele não foi o - descobridor - da Homeopatia, mas podemos
considerá-lo seu - pai -, a figura que realmente sistematizou o método
de tratamento através da Lei da Semelhança.
Existem duas formas básicas de curar um sofrimento: combatendo-o, ou
seja, através da Lei dos Contrários, e também através da Lei dos
Semelhantes, quando procuramos que o organismo reaja, combatendo o mal
que o aflige.
A idéia de curar através da Lei da Semelhança já existia, era anterior a
Hahnemann. Ele tornou-a possível, estabelecendo um método terapêutico
adequado para sua aplicação. Para isto, determinou uma técnica de
preparo de medicamentos específica, propondo também sua forma de uso.
A idéia era utilizar uma substância que provocasse sintomas semelhantes
aos observados no indivíduo doente. Porém, se fosse usada uma grande
quantidade desta substância, o resultado seria tornar o indivíduo, já
doente, ainda mais doente, e com os mesmos sintomas. Portanto, Hahnemann
pensou em usar a mesma substância (Lei da Semelhança), porém em
quantidade pequena, bem pequena mesmo.
Desta forma, ele começou a diluir as substâncias que tencionava
utilizar. Todos nós temos porém a noção de que, se usarmos uma
quantidade MUITO pequena, a ação da substância deve diminuir, e talvez
até desaparecer. Quando Hahnemann começou a diminuir a quantidade,
percebeu isto também. Observador atento, notou também que, AO AGITAR a
solução - talvez de forma intuitiva, talvez no início apenas para bem
homogeneizá-la - ela, em vez de perder sua força, pelo contrário,
tornava-se mais potente, mais ativa. Apesar de conter cada vez menor
quantidade da substância inicial, a solução parecia adquirir uma - força
-. A este processo conjunto, de diluição e agitação, Hahnemann deu o
nome de dinamização, lembrando - dynamo -, ou força. Chamamos de
potência ao número de vezes que a substância foi dinamizada. Quanto mais
dinamizada, maior a potência do medicamento. Do ponto de vista
homeopático, dizemos que, quanto mais dinamizado (e portanto mais
diluído), mais potente é o medicamento. Do ponto de vista clínico,
também mais potente ele será.
Os medicamentos homeopáticos são (quase sempre) dinamizados, isto é, a
substância original é diluída e agitada. Para que isto ocorra, partindo
de uma substância com a qual preparemos um medicamento, temos que
considerar se ela é solúvel ou não. Para afirmarmos se esta solubilidade
ocorre, é importante admitirmos quais solventes podem ser utilizados: os
tradicionalmente usados são a água, o álcool etílico e a glicerina.
Quando a substância não for solúvel nestes solventes, precisaremos
lançar mão de outra estratégia, que será a trituração.
Na dinamização, usamos uma solução hidroalcoólica para diluir
(frequentemente álcool a 30%) e movimentos de - batida - contra um
anteparo semi-rígido para agitação. Chamamos este processo de agitação
de sucussão. Se uma substância é solúvel em água ou álcool etílico,
puros ou combinados, ela será dissolvida, na proporção de 1%, e agitada
100 vezes. Em seguida, nova diluição e 100 agitações.
Já o processo de trituração será aplicado para substâncias insolúveis.
Neste caso, usaremos a lactose para - diluir -. Para agitar, usaremos o
movimento de triturar a substância entre o pistilo de porcelana, contra
as paredes do recipiente, um gral de porcelana. A trituração é feita
também na proporção de 1% da substância ativa em lactose. Divide-se a
lactose em 3 porções. Toma-se cada uma destas porções, coloca-se no gral
de porcelana e tritura durante 6 minutos. Como a mistura da lactose com
a substância fica fortemente aderida nas paredes do gral, é necessário
raspar, com uma espátula também de porcelana, as paredes do gral,
fazendo com que a lactose possa ser novamente triturada, por mais 6
minutos, e novamente raspada. Adiciona-se o segundo terço da lactose,
repete-se o procedimento. Adiciona-se o terceiro terço da lactose e
repete-se, pela última vez. Assim, depois de 1 hora, obtemos a primeira
trituração – centesimal – da substância. Fazendo isto mais uma vez (mais
uma hora) e ainda outra vez (uma terceira hora), chegamos à terceira
trituração centesimal da substância, que pode ser solubilizada em
solução hidroalcoólica. A dinamização continuará então conforme já
descrito acima, através da diluição e da agitação.
Quando partimos de um vegetal ou animal, podemos triturá-lo, porém
usualmente preparamos uma tintura, isto é, uma extração alcoólica da
substância. Como esta tintura será diluída e dará origem às dinamizações
(seus - filhotes -), ela é chamada de tintura-mãe. A tintura-mãe é feita
colocando-se a substância em contato com solução alcoólica de graduação
adequada para que os princípios ativos da planta sejam retirados,
passando para a solução. É o mesmo princípio das populares - garrafadas
-. Chama-se - tintura - porque extrai também princípios ativos
coloridos, formando um líquido colorido. As tinturas são usadas de forma
pura, porém para Homeopatia, são diluídas em soluções hidroalcoólicas e
agitadas, isto é, dinamizadas.
As diluições podem ser feitas em diferentes proporções ou escalas. A
mais comum é na proporção de 1:100, também chamada escala centesimal.
Para fazê-la, usamos 1 parte da droga para 99 partes de solução
água/álcool. É a mais comum entre nós e foi preconizada por Hahnemann. O
médico alemão Hering, introduziu a escala decimal, preparada na
proporção de 1:10, isto é, 1 parte da substância medicinal para 9 partes
de solução hidroalcoólica.
Este método é chamado de hahnemanniano, também chamado de - frascos
separados -. As agitações podem ser feitas manualmente (através de
movimentos ritmados do antebraço, de batida contra o anteparo) ou
através de um equipamento chamado de - braço mecânico -, quando uma
máquina tenta reproduzir o movimento do braço. É uma técnica simples,
porém, demorada e trabalhosa. Os medicamentos assim produzidos são
chamado de CH, porque foram diluídos através da escala centesimal (por
isto C) e método hahnemanniano (H).
Quando se pergunta até que potência uma substância pode ser dinamizada
através do método hahnemanniano, a resposta é... depende. Depende do
tempo disponível, do número de funcionários, da proposta de trabalho da
farmácia. Alguns farmacêuticos propõem-se a dinamizar até a 30CH, outros
chegam à 200CH, outros sobem alguns medicamentos até a 1000CH ou mesmo
seguem além.
Para obter potências superiores, existem outras possibilidades. Há
muitos anos, o russo Korsakov imaginou um método mais prático, menos
trabalhoso para dinamizar. Propôs que se diluísse a substância,
sucussionasse e depois disso, vertesse o conteúdo do frasco aberto,
deixando que escorra todo o conteúdo. Desta maneira, resta no frasco 1%
da dinamização anterior. Depois disso, novamente enchemos o frasco,
sucussionamos e esvaziamos. Fazemos isto sucessivamente, até a potência
K desejada.
Existe ainda outro método mecânico para preparo de altas potências, que
é o fluxo contínuo. Trata-se de um equipamento mecânico, composto de uma
câmara de vidro, onde ocorre a dinamização. Aí é colocada a dinamização
30CH da substância a ser dinamizada. Nesta câmara há entrada de água (o
diluente) de modo contínuo, e também um orifício para saída da água. Uma
haste de vidro, com uma pá na extremidade, gira em torno de si mesma,
produzindo a agitação. Ligamos a agitação (isto é, ligamos o motor) ao
mesmo tempo que abrimos a entrada de água. Desta maneira, a diluição e a
agitação iniciam-se ao mesmo tempo. Diferente do processo hahnemanniano,
agora a diluição é contínua, e daí o próprio nome do processo, fluxo
contínuo.
A água destilada vai diluir a substância, que é colocada já na potência
30CH. O motor possue um eixo, que gira, provocando um movimento. Esta
agitação, mais a entrada de água, vão provocar uma dinamização.
Conhecendo a rotação do motor e o volume de água que passa pelo sistema,
podemos calcular o tempo necessário para obter altas dinamizações, de
forma mecânica, mais fácil e rápido do que o sistema manual.
No final de sua vida, Hahnemann propôs ainda um método diferente para
preparo de medicamentos homeopáticos: a cinquenta-milesimal (LM). Este
método também apresenta uma nova escala de diluição, que é de no mínimo
1:50.000 a cada passagem. Iniciamos triturando sempre todas as
substâncias, durante 3 horas. Em seguida é preparada uma solução com
0,06g da 3ª trituração e 500 gotas de uma solução preparada com 400
gotas de água e 100 gotas de álcool. Tiramos 1 gota desta solução e
adicionamos 100 gotas de álcool. Fazemos 100 fortes sucussões e com esta
solução (chamada LM1) vamos impregnar pequenos glóbulos (microglóbulos
cuja uma centena pesam 0,06g). Para prosseguir, tomamos 1 desses
microglóbulos, dissolvemos com 1 gota de água, adicionamos 100 gotas de
álcool e novamente fazemos 100 fortes sucussões, obtendo a LM2.
Continuamos desta maneira as potências LM seguintes.
Para Hahnemann, este método causaria menos agravações nos pacientes,
possibilitando uma cura rápida, suave e duradoura.
É importante notar que uma dinamização CH não é igual a uma K e tampouco
a uma FC ou a uma LM, e nem existe equivalência entre elas. Apesar de
atribuirmos o mesmo valor numérico, trata-se de métodos diferentes, que
produzirão diferentes medicamentos. Então, uma Belladonna 200CH é
diferente de uma Belladonna 200FC e também diferente de uma Belladonna
200K. Por isto, é importante citarmos sempre um medicamento com seu nome
completo, isto é, o nome da substância, sua potência e o método de
obtenção. Veja os exemplos abaixo:
Nux vomica 30CH é dinamizado através de método hahnemanniano, em escala
centesimal, até a 30ª potência.
Lachesis 200K é dinamizado através de método korsakoviano, até a 200ª
potência.
Graphites 1000FC é dinamizado através de método fluxo contínuo, até a
milésima potência.
Agora vamos falar de onde vem as substâncias utilizadas para preparar
medicamentos homeopáticos. Nos exemplos acima temos a Nux vomica, que é
uma planta. Neste caso, é importante utilizarmos a planta perfeitamente
identificada, além da parte correta, coletada na época adequada do ano,
do dia, da fase de crescimento da planta, tudo que for importante e
estiver descrito na literatura farmacêutica. Aliás, é sempre bom lembrar
que esta descrição deve ser exatamente aquela da substância utilizada na
patogenesia, isto é, quando os sintomas foram obtidos na experimentação
da droga com indivíduos saudáveis.
Sabemos então que vegetais podem originar medicamentos homeopáticos.
Aliás, a maior parte deles provém mesmo do reino vegetal, cerca de 70%.
Talvez por isto, frequentemente a Homeopatia é confundida com chás e
extratos vegetais. Na verdade, eles são parte da Fitoterapia, que é a
terapêutica através dos vegetais. A Homeopatia utiliza vegetais, porém
quase sempre transformados através da dinamização. É até possível
utilizar extratos e tinturas vegetais de acordo com a Lei da Semelhança,
mas é uma exceção na terapêutica homeopática.
Voltando aos exemplos anteriores, percebemos que os medicamentos
homeopáticos também podem ser obtidos a partir de animais, como
secreções, venenos (Lachesis), animais inteiros (Coccus cacti -
conferir) ou de suas partes (ver exemplo). Nos casos citados são
utilizados animais saudáveis, porém às vezes é uma secreção patológica
que importa (Psorinum, por exemplo, é preparado através da secreção da
sarna).
Ainda fazemos medicamentos a partir de minerais, como o Ferro (Ferrum
metallicum), o grafite (Graphites), cristais (Silica) ou Enxôfre (Sulphur).
Podemos fazer tinturas-mãe de vegetais e de animais, porém não dos
minerais. Uma parte pode ser solubilizada (como Cloreto de Sódio, que
chamamos de Natrum muriaticum), porém diversos minerais são insolúveis,
e para eles lançamos mão da trituração, já descrita acima.
Outro ponto a ser realçado é o nome que os homeopatas utilizam: Natrum
muriaticum em vez de Cloreto de Sódio, por exemplo. É que são os nomes
latinos dos sais químicos e dos minerais, assim como os nomes
científicos dos vegetais e dos animais. Algumas vezes estes nomes são
modificados pelos especialistas, porém são mantidos tradicionalmente, e
por isto o mais correto é dizer que utilizamos nomes homeopáticos, em
vez de nomes científicos.
Uma vez obtida a dinamização desejada, feita a partir de determinada
substância, em dado método, escala e potência, é agora necessário
adicioná-la a um veículo adequado para ser administrado. Surgem então as
formas farmacêuticas utilizadas para medicamentos homeopáticos.
A mais comum são os glóbulos, que são pequenas esferas brancas, feitas
de sacarose. As farmácias homeopáticas compram glóbulos neutros,
inertes, e colocam determinada % da dinamização desejada sobre eles.
Esta % depende da literatura seguida, e varia de 1 a 10%.
Em seguida, aparece a forma líquida, administrada em gotas ou em
colheradas (doses repetidas) ou como dose única. O veículo varia entre
água destilada (cuja validade é pequena, de até 48 horas) até solução
hidroalcoólica em variados teores, principalmente por volta de 30% para
gotas.
Existem ainda prescrições em comprimidos (feitos em máquinas de
comprimir, normalmente pela ind, em pastilhas ou tabletes, em pó (que
pode ser acondicionado em papéis ou em cápsulas).
Como você puderam ter uma idéia, a técnica de preparo do medicamento
homeopático é simples, ainda que exija paciência, dedicação e
perseverança. Em nosso país os medicamentos são dinamizados em farmácias
homeopáticas, que contam com a presença do farmacêutico homeopata. Este
profissional, além de atender aos clientes, prepara os medicamentos
prescritos por clínicos homeopatas: médicos, dentistas e veterinários.
Tendo uma oportunidade, não deixe de conhecer uma farmácia homeopática.
Você verá um estabelecimento farmacêutico diferente de uma farmácia
comum, dedicado ao atendimento da população.
Texto 6
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